Psicanálise na Periferia: a potência da escuta onde ela quase nunca chega

Quando falamos de psicanálise, muita gente ainda imagina um divã numa sala luxuosa, em bairros nobres e silenciosos. Mas a escuta psicanalítica também pulsa nas vielas, nas comunidades, nos becos e nos lares onde a sobrevivência é uma urgência cotidiana. A periferia também sofre, também sonha e, sobretudo, também precisa ser ouvida.

A psicanálise na periferia é, antes de tudo, um ato de resistência. É escutar aquilo que nunca foi dito porque nunca teve espaço. É acolher dores que foram naturalizadas, silêncios que gritam e histórias que insistem em viver. É chegar com cuidado, sem saber tudo, mas com disposição para construir juntos um lugar possível de existência.

Como dizia Donald Winnicott, psicanalista que nos inspira tanto:

“Não existe bebê sem um cuidador. O bebê e o cuidador formam uma unidade.”
Essa frase nos lembra que ninguém nasce ou cresce só. E, na periferia, essa rede de cuidado muitas vezes é fragilizada por políticas públicas ausentes, pela correria da sobrevivência, pela solidão de quem não pode parar para sentir.

Por isso, a escuta na psicanálise — especialmente em contextos periféricos — é mais do que técnica: é presença. É estar junto sem julgar. É oferecer um espaço onde a pessoa possa ser, sentir e até se desmontar, para talvez se reconstruir com mais verdade.

“É no brincar, e talvez apenas no brincar, que a criança ou o adulto fruem sua liberdade de criação.” — Winnicott

A periferia também quer brincar. Também quer sonhar, criar, se reinventar. Mas para isso, é preciso primeiro um lugar seguro — interno e externo — onde isso possa acontecer. A escuta analítica é essa travessia. É o solo fértil onde o sujeito se reconhece não só pelas feridas, mas também pelas potências.

“A saúde mental tem a ver com a capacidade de estar só, na presença de outro.” — Winnicott

Esse “outro” é o analista, mas pode ser também a vizinha que escuta sem interromper, a educadora que acolhe, a agente de saúde que olha no olho. A psicanálise precisa se abrir ao mundo real, onde a escuta vale mais do que qualquer teoria, onde a presença transforma mais do que qualquer diagnóstico.

A escuta, na periferia, é uma forma de existir. E quando ela é feita com cuidado, com afeto e com ética, ela se torna um ato político, terapêutico e revolucionário.

Que a psicanálise chegue onde a dor mora, e que lá encontre abrigo, cuidado e transformação. Se faz sentido para você, talvez seja uma ótima oportunidade de estar, do jeito que está e a terapia pode te ajudar nisso.

 

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